Por Marcos Fonseca – Matéria em destaque dos pesquisadores Ricardo Abramovay e equipe (USP e Fiocruz) – Revista de Saúde Pública
Você sabe o que significa O mito do déficit de proteína?
Muito se fala sobre o déficit de proteína como se fosse uma realidade preocupante no Brasil.
Desde o século passado, a ideia de que populações mais pobres sofrem com carência proteica alimentou políticas públicas, influenciou profissionais de saúde e foi explorada pela indústria alimentícia.
No entanto, um estudo publicado em 2025 por Ricardo Abramovay (USP), Nadine Marques Nunes-Galbes, Fernanda Helena Marrocos-Leite, Eduardo Augusto Fernandes Nilson (Fiocruz) e Maria Laura da Costa Louzada (USP) derruba esse mito.
O artigo “O mito do déficit proteico”, divulgado na Revista de Saúde Pública, mostra que, na realidade, o que falta na mesa do brasileiro não são proteínas, mas frutas, legumes e verduras.
O que é o mito do déficit proteico?
A crença de que milhões sofrem de falta de proteínas vem de políticas internacionais criadas no século XX. Durante décadas, acreditou-se que o kwashiorkor, uma forma de desnutrição, era resultado direto da baixa ingestão de proteínas.
Contudo, evidências mostram em: O mito do déficit de proteína, que, quando a ingestão calórica é suficiente, dificilmente haverá déficit proteico, exceto em casos extremos de dietas restritas a poucos alimentos com baixo teor proteico (ex.: mandioca e inhame).
Por que ainda acreditamos na falta de proteína?
Interesses históricos e econômicos
- A FAO e a UNICEF promoveram a ideia do “protein gap” (lacuna proteica).
- Políticas globais incentivaram a distribuição de leite em pó e outros industrializados.
- A indústria pecuária e de laticínios se beneficiou, reforçando o mito.
Esse discurso fortaleceu o consumo de produtos ricos em proteínas, mas ignorou a importância da diversidade alimentar.
O que os dados mostram no Brasil
A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2017–2018) analisou a ingestão alimentar de mais de 46 mil brasileiros. Os resultados foram claros:
Faixa de renda | % de calorias de proteínas | Déficit proteico (%) |
---|---|---|
20% mais pobres | 18,6% | 2,6% |
20–40% | 18,2% | 3,4% |
40–60% | 18,2% | 2,9% |
60–80% | 18,2% | 3,1% |
20% mais ricos | 18,3% | 2,3% |
Fonte: POF 2017–2018O mito do déficit proteico
Na íntegra: RESUMO da revista de Saúde Pública sobre O mito do déficit de proteína
Dados epidemiológicos apontam que o consumo de alimentos de origem animal nos países de alta renda é excessivo e prejudicial à saúde. Mas é frequente, tanto na literatura científica como nos documentos das organizações multilaterais, a associação entre pobreza e carência de proteínas.
Há uma armadilha conceitual neste vínculo, que consiste em concentrar a atenção em um nutriente e não no conjunto do padrão alimentar.
Em 1974, num texto que se tornou um clássico da ciência da nutrição, Donald McLaren já mostrava o erro das organizações multilaterais de desenvolvimento em focar seus esforços na oferta de proteínas (inclusive sob formas industrializadas) sem levar em conta que, com raras exceções, quando se alcança suficiência energética, dificilmente haverá déficit proteico.
Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2017 a 2018 ajudam a desfazer esse mito: mesmo entre os 20% mais pobres da população brasileira, é ínfima a proporção dos que apresentam ingestão proteica insuficiente.
DESCRITORES: Necessidade Proteica. Recomendações Nutricionais. Alimentos Formulados. Kwashiorkor. População
O verdadeiro desafio da alimentação
O déficit real está em outros nutrientes essenciais. Segundo o Vigitel 2023, 78,6% dos brasileiros não consomem frutas, verduras e legumes em quantidade suficiente.
Lista dos principais déficits na dieta nacional:
- Baixo consumo de frutas e verduras.
- Alto consumo de ultraprocessados.
- Excesso de carnes vermelhas e processadas.
- Pouca variedade de alimentos in natura.
Excesso de proteína: riscos para a saúde
O mito gerou outro problema: a crença de que “quanto mais proteína, melhor”. Isso levou muitas pessoas a consumirem acima do recomendado.
Principais riscos do excesso proteico:
- Sobrecarga dos rins e fígado.
- Maior risco de doenças cardiovasculares.
- Alterações metabólicas prejudiciais ao pâncreas e até ao tecido muscular.
- Maior chance de ganho de peso quando associada a dietas hiperproteicas e ultraprocessadas.
Impactos ambientais da produção de proteínas animais
Além da saúde, a produção intensiva de carnes tem efeitos negativos para o planeta:
- Emissão de gases de efeito estufa, como metano.
- Uso excessivo de antibióticos na criação de aves e suínos.
- Resistência antimicrobiana crescente, um alerta da OMS.
- Desmatamento e perda da biodiversidade.
Dicas práticas para equilibrar sua alimentação
Se o problema não é o déficit de proteína, mas sim a falta de diversidade, veja como equilibrar melhor sua dieta:
Substituições inteligentes
- Troque carne em excesso por feijões, lentilhas e grão-de-bico.
- Substitua snacks ultraprocessados por castanhas, frutas secas e sementes.
Combinações de proteínas vegetais
- Arroz + feijão = proteína completa.
- Milho + ervilha = equilíbrio de aminoácidos.
- Grão-de-bico + quinoa = opção nutritiva e leve.
Cardápio acessível para mais equilíbrio
Café da manhã: pão integral com pasta de grão-de-bico + suco natural.
Almoço: arroz, feijão, salada variada, frango grelhado em porção moderada.
Lanche: frutas da estação + oleaginosas.
Jantar: sopa de legumes com lentilha + salada de folhas.
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Conclusão: O mito do déficit de proteína
O estudo “O mito do déficit proteico” deixa uma mensagem clara: o Brasil não sofre com falta de proteínas, mas sim com excesso de consumo proteico e baixa diversidade alimentar.
A obsessão com proteínas é fruto de um legado histórico, reforçado por interesses econômicos da indústria alimentar. Mas os dados atuais mostram que até os brasileiros mais pobres consomem proteínas acima das recomendações internacionais.
O verdadeiro déficit está no prato pouco colorido, pobre em frutas, verduras e legumes. Essa falta de diversidade alimentar é um risco maior para a saúde pública do que a suposta carência de proteínas.
A solução passa por repensar a dieta: reduzir o excesso de carnes e ultraprocessados e aumentar o consumo de alimentos frescos, de origem vegetal e mais próximos da nossa cultura alimentar.
Para ter saúde com equilíbrio, o caminho não é comer mais proteína, mas sim buscar um prato variado, nutritivo e sustentável. Esse é o verdadeiro desafio para indivíduos, famílias e políticas públicas.
FAQ – Perguntas frequentes sobre O mito do déficit de proteína
1. Existe déficit de proteína no Brasil?
Não. Dados mostram que todas as classes sociais consomem proteínas acima das recomendações da OMS.
2. O excesso de proteína pode fazer mal?
Sim. Pode causar problemas renais, hepáticos e cardiovasculares.
3. Qual a quantidade ideal de proteína?
Entre 10% e 15% das calorias diárias, segundo a OMS.
4. O que realmente falta na dieta dos brasileiros?
Frutas, verduras e legumes em quantidade suficiente.
5. Como equilibrar proteínas e vegetais?
Combinando leguminosas, grãos, cereais integrais e hortaliças.
6. Dietas hiperproteicas ajudam a emagrecer?
Podem trazer resultados rápidos, mas oferecem riscos se mantidas a longo prazo.
7. Vegetarianos sofrem déficit de proteína?
Não, desde que mantenham uma dieta diversificada com leguminosas, grãos e oleaginosas.
8. Por que o mito do déficit de proteína persiste?
Por influência histórica, interesses econômicos e marketing da indústria alimentícia.
9. Crianças precisam de mais proteína?
Precisam de quantidade adequada, mas não em excesso. O equilíbrio é fundamental.
10. Como adotar uma dieta mais equilibrada no dia a dia?
Reduzindo carnes e ultraprocessados e priorizando alimentos frescos, coloridos e variados.
Termo de responsabilidade
Este artigo tem caráter informativo e educacional. Não substitui acompanhamento médico, nutricional ou profissional de saúde. O blog Saúde com Equilíbrio e seu autor não se responsabilizam por decisões tomadas com base neste conteúdo. Em caso de dúvidas específicas, consulte um profissional de saúde qualificado. Cuide-se!
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